Quase 1,4 milhões de alunos perderam aulas por falta de professor
A Federação Nacional de Professores (Fenprof) estima que, neste ano letivo, quase 1,4 milhões de alunos foram penalizados pela falta de docentes. As aulas no 1.° Ciclo e atividades do Pré-Escolar terminaram na última semana sem que o Governo divulgasse a prometida auditoria ao número de estudantes sem aulas. Questionado sobre o balanço do ano, o Ministério da Educação não respondeu ao JN em tempo útil.
Com todos os alunos em férias e quando nas escolas já se prepara o próximo ano letivo, a Fenprof faz um balanço negativo de 2024/2025. “Alguns problemas, como a falta de professores, agravaram-se. É com muita preocupação que olhamos para o próximo ano”, frisa José Feliciano Costa, um dos dois secretários-gerais da Fenprof.
João Pereira, dirigente da mesma federação, somou o acumulado das estimativas feitas para cada semana com base nos horários por preencher lançados pelas escolas: 826 mil alunos no 1.° período, 402 mil no 2.° período e cerca de 150 mil no 3.°. No entanto, há alunos que podem ter tido a falta de vários professores, durante vários períodos e contar mais do que uma vez para esta estatística.
Os diretores também não dão boa nota: António Castel-Branco, presidente do Conselho das Escolas, Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores (ANDAEP), e Manuel Pereira, presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares (ANDE), apontam a falta de professores como o maior problema do sistema de ensino, que continuou a agravar-se no ano letivo, apesar do plano do Governo “Mais aulas, mais sucesso”. Todos concordam que o “brutal” número de horas extraordinárias atribuídas aos docentes foi a medida que impediu “uma catástrofe”.
Lisboa, Setúbal e Faro
Face ao ano anterior, são quase mais 50 mil alunos (740 mil alunos no 1.° período de 2023/2024, 370 mil no 2.° período e 220 mil no 3.°). A média de alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina por semana oscila entre 25 mil e 30 mil, calcula João Pereira. Houve semanas em que esse número ultrapassou os cem mil alunos, no 1.° período, e ficou abaixo de 20 mil no 3.° período.
O problema continua a ser mais grave em Lisboa, Setúbal e Faro, mas já não há nenhum distrito sem dificuldades nas substituições, insiste a Fenprof.
Um dos principais objetivos do ministro da Educação, Ciência e Inovação (MECI) para este ano letivo era acabar com períodos prolongados sem aulas. Chegou a ser definida como meta, para final do 1.° período, a redução de 90% do número de alunos sem todos os professores. Depois de ter assumido que divulgou dados incorretos, Fernando Alexandre pediu uma auditoria à KPMG, cujos resultados foram anunciados para março e depois abril. No início de maio, o Governo assumiu que as conclusões ainda não tinham sido entregues.
Diretores e Fenprof garantem que, além das horas extraordinárias, a falta de professores foi combatida pelos docentes que aceitaram adiar a reforma; pelo recrutamento de não profissionalizados (sem mestrado em ensino); pela aceitação de horários, por exemplo, de TIC; por docentes de outros grupos, como Educação Física; ou técnicos especializados, como psicólogos, em horários de 1.º ciclo ou Educação Especial.
Menos docentes não colocados neste ano
Para ilustrar o impacto da falta de professores, o presidente do Conselho das Escolas, António Castel-Branco, descreve: “Pela primeira vez, no concurso externo, fiquei com vagas de quadro por preencher”. Acabou por ter de assumir uma turma durante o ano por não conseguir preencher o horário, e garantiu que só com a atribuição de muitas horas extraordinárias, o recrutamento de professores não profissionalizados (sem mestrado em ensino) e horários preenchidos com docentes de outros grupos conseguiu que os alunos “não tivessem aulas, no máximo, três semanas a um mês”.
Dimensão das turmas
“Foi um ano ensombrado com a falta de professores, com as regiões Centro e Norte já a sentir dificuldades nas substituições” de aposentações e baixas, sublinha Filinto Lima. Os diretores, frisa, aguardam “ansiosamente” a publicação do novo despacho de Organização do Ano Letivo.
O presidente da ANDAEP pede ao Governo que unifique os créditos horários num só e dê autonomia aos diretores para gerirem, incluindo a dimensão das turmas. Já Manuel Pereira receia que o diploma obrigue as escolas a criarem todas as turmas no máximo de alunos (25 no 1.° ciclo e 28 nos restantes). “Reduziria a necessidade de professores, mas pedagogicamente seria uma catástrofe”, defende o presidente da ANDE.
Pormenores
Nos quadros
Em setembro, 6176 professores entram nos quadros, 2628 dos quais através da norma-travão e vinculação dinâmica, e 1792 sem tempo de serviço nas escolas públicas.
Adiar reforma
Era uma das medidas do plano que terão superado a meta: mais de mil professores aceitaram o suplemento de 750 euros e adiaram a aposentação. Pouco mais de 50 reformados aceitaram regressar às escolas.
Por cumprir
Plano previa o recrutamento de 140 técnicos superiores para darem apoio administrativo a diretores de turma. O JN interpelou o MECI sobre o lançamento deste concurso, não tendo recebido resposta. Os diretores garantem não ter conhecimento deste reforço.
Apoio à deslocação
O Parlamento aprovou, em março, o alargamento do apoio à deslocação para todos os professores colocados a mais de 70 quilómetros de casa, que deve vigorar no próximo ano. Em abril, o ministro revelou que 2500 docentes estavam a receber o apoio, que oscila entre 150 e 450 euros, consoante a distância, tendo sido este ano aplicado a colocados em escolas sinalizadas como carenciadas.
Revisão do ECD
É a principal reivindicação de diretores e dirigentes sindicais para tornar a carreira atrativa e combater a falta de professores. O programa do Governo prevê, por exemplo, aumentos salariais nos primeiros escalões e o fim das vagas de acesso ao 5.º e 7.º escalões, mas aponta o final da legislatura como meta para conclusão das negociações. A Fenprof reclama a antecipação das reuniões, interrompidas, com a queda do Governo.