Montenegro desafia PS a não servir de “bloqueio” e avisa que país não está “de cofres cheios”

No discurso de tomada de posse, no Palácio da Ajuda, Montenegro revelou que desafiará, desde já, todos os partidos a elaborar uma agenda de combate à corrupção, com o objetivo de reunir “uma síntese de propostas” no espaço de dois meses. Na área da Saúde, comprometeu-se a apresentar um programa de emergência até dia 2 de junho.

O novo chefe de Governo também se comprometeu com o combate à burocracia e com a fixação dos jovens em Portugal. Sobre a imigração – tema caro ao Chega e sobre o qual Passos Coelho fez uma polémica intervenção durante a campanha -, disse querer um país “humanista e acolhedor”, que não esteja “nem de portas escancaradas nem de portas fechadas”.

O novo chefe do Governo prometeu que a sua equipa terá “capacidade de diálogo” com as restantes forças políticas. Nesse sentido, afirmou que “é isso que também se espera das oposições”, avisando ainda que este não é um Executivo “de turno” e que tenciona levar a legislatura até ao fim.

Aludindo ao facto de o PS já ter anunciado que, embora vá viabilizar o programa de Governo, não garante a aprovação do Orçamento do Estado, o novo primeiro-ministro deixou outro alerta aos socialistas: “Não rejeitar o programa de Governo não significa um cheque em branco [ao Executivo], mas também não pode significar um cheque sem cobertura”.

Ideia de que excedente gerou um “país rico” é “ofensa” a quem vive mal

Num reconhecimento tácito de que as promessas feitas durante a campanha eleitoral criaram elevadas expectativas em vários setores, Montenegro procurou desmontar a ideia de que há dinheiro para tudo: avisou que o país não passou a estar “de cofres cheios” por ter tido um excedente orçamental, vincando que essa ideia é até “uma ofensa” para quem vive em dificuldades.

“Nâo ficámos um país rico só porque tivemos um superávit orçamental”, sublinhou o primeiro-ministro, referindo-se ao excedente obtido pelo Executivo anterior. Colocando um travão às pretensões populares, realçou que “a teoria dos cofres cheios conduz à reivindicação desmedida e descontrolada de despesas insustentáveis”.

Ainda assim, Montenegro garantiu que cumprirá as promessas “de desagravamento fiscal, de valorização dos salários e das pensões, de reestruturação dos serviços públicos e modernização do Estado”. Contudo, não o fará “à sombra da ilusão de um excedente”, e sim através de “uma economia mais produtiva e competitiva e de um Estado renovado e eficiente”.

No início do discurso, Montenegro citou um poema de Sophia de Mello Breyner sobre o dia “inteiro e limpo” que foi o 25 de Abril de 1974. Aludiu também ao Papa Francisco e terminou com uma referência aos 500 anos de Luís de Camões, um “herói” português que “merecerá, ainda este ano, a devida celebração”. Recorde-se que o anterior Governo foi criticado por não assinalar esta efeméride.

Pedro Nuno Santos não foi à cerimónia

Esta tomada de posse ocorre dois anos e dois dias depois da do último Governo de António Costa. Na altura, recorde-se, o presidente da República avisou o primeiro-ministro, eleito com maioria absoluta, de que uma eventual saída para um cargo europeu significaria a queda do Executivo.

Nessa ocasião, o chefe de Estado não poupou nos recados a Costa: “Agora que ganhou – e ganhou por quatro anos e meio –, tenho a certeza de que Vossa Excelência sabe que não será politicamente fácil que essa cara que venceu de forma incontestável e notável as eleições possa ser substituída por outra a meio do caminho”, avisou. Acrescentou que este era “o preço das grandes vitórias”.

Os ministros do Governo de António Costa, que cessam funções, assistiram à posse dos sucessores nas primeiras filas da sala do Palácio da Ajuda. Costa ficou sentado ao lado da mulher de Luís Montenegro. O líder do PS, Pedro Nuno Santos, não marcou presença, tendo sido representado por Alexandra Leitão.

Nem BE nem PCP estiveram na cerimónia. Os primeiros fizeram saber, à Lusa, que, “tal como acontreceu no passado”, não assistem à posse “de um Governo de Direita”. Já os comunistas lembraram que não têm por hábito marcar presença em tomadas de posses de Executivos; apenas quebraram a tradição em 2015 – ano da criação da geringonça – para marcar uma posição contra o então presidente Cavaco Silva.